Cruzador Bahia: A volta de um fantasma

Livro de pernambucano diz que cruzador Bahia foi afundado por submarino alemão, em 1945

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Renato Mota/Jornal do Commercio

Um mistério de 68 anos ainda ronda os mares do Atlântico. O naufrágio do cruzador Bahia, em julho de 1945, que vitimou mais de 300 marinheiros, ainda é motivo de polêmica entre pesquisadores. Isso porque a versão oficial da época diz que o navio veio a pique depois de um acidente durante um treinamento, quando estava próximo aos Rochedos de São Pedro e São Paulo. Mas há quem acredite que, na verdade, o cruzador brasileiro foi atacado por submarinos alemães, que posteriormente renderam-se na Argentina.

A segunda versão é defendida pelo ex-oficial da Marinha e escritor pernambucano Paulo Afonso Paiva, que está lançando o romance O porto distante, uma ficção histórica que recria os últimos dias do Bahia. “Essa foi a maior tragédia da nossa história naval. Temos nosso próprio Titanic, e poucas pessoas conhecem esses acontecimentos”, afirma Paiva. O livro é resultado de dez anos de pesquisa sobre o incidente e o dia a dia dos marinheiros durante a Segunda Guerra, mas as peças que faltavam ao quebra-cabeça vieram só em 2010, com o lançamento do livro Ultramar Sul: a última operação secreta do Terceiro Reich, dos argentinos Jan Salinas e Carlos De Nápoli. “Eles tiveram acesso ao arquivo da marinha argentina que relata os interrogatórios dos comandantes dos submarinos”, conta Paiva.

A narrativa do que verdadeiramente aconteceu naquela manhã de 4 de julho de 1945 sempre foi confusa. As primeiras matérias jornalísticas da época só começaram a sair a partir do dia 10, já que na véspera tinham sido encontrados os primeiros sobreviventes. “Em consequência duma explosão, verificada nas proximidades dos rochedos de São Pedro e São Paulo, afundou o cruzador brasileiro Bahia”, foi a manchete do JC no dia. O que se sabia, até então, era que durante exercícios de guerra, por volta das 9h10, o navio teria sofrido uma grande explosão, que matou cerca de 100 marinheiros logo de cara, e teria afundado em cerca de 4 minutos. Dos 382 tripulantes, só 36 foram resgatados.

Segundo Paiva, o Bahia estava na região servindo de apoio para a comunicação entre os aviões americanos que voltavam da Europa. “A guerra contra a Alemanha já tinha terminado. O navio estava lá, como um pato, dando suporte à Quarta Frota dos EUA, que comandava as ações aqui. Na tripulação constavam, inclusive, quatro telegrafistas americanos”, explica o escritor. De fato, naquela manhã, estavam sendo realizados treinamentos, mas de acordo com Paiva, a possibilidade de que uma das metralhadoras anti-aéreas atingisse o próprio Bahia é remota. “Esse tipo de equipamento contava com uma proteção para que, durante um combate, o artilheiro não alvejasse o próprio navio por engano. Esse dispositivo até pode ser retirado, mas requer o trabalho de três pessoas, algo que não vale a pena”, completa o escritor.

Suspeitas de que o naufrágio não tenha ocorrido por acidente não são novas. Jornais da época já discorriam sobre possíveis causas para a tragédia, como próprio JC, do dia 17, que afirmou que alguns torpedos “mais modernos” não deixam rastros na água, o que explicaria o fato da tripulação do Bahia ter sido pega de surpresa. “Além disso, uma explosão do paiol de pólvora, como se discutiu na época, não faria um estrago tão grande, já que parte da energia se dispersaria”, afirma Paiva.

Entretanto, o inquérito definitivo sobre o naufrágio cabia ao comando da Quarta Frota Americana, na pessoa do almirante Jonas Howard Ingram, que em outubro daquele ano divulgou que “aquele cruzador fora sinistrado por uma rajada de metralhadoras do próprio cruzador Bahia, que, durante um exercício de rotina, atingira acidentalmente um grupo de bombas de profundidade localizados na popa do navio”. E essa é a versão oficial até hoje.

Mas se o motivo da explosão do Bahia era objeto de debate, as suspeitas aumentaram exponencialmente quando, dias depois do naufrágio, o submarino alemão U-530 chegou a Mar del Plata, na Argentina, e rendeu-se a autoridades locais. “A guerra tinha terminado havia dois meses. O que aquele submarino estava fazendo no mar ainda? Também não era segredo que a Argentina vinha acolhendo vários oficiais nazistas depois do conflito”, afirma o escritor.

O comandante da Força Naval do Nordeste, o almirante Soares Dutra, em entrevista ao JC do dia 13 de julho de 1945, contou que “é possível(que o Bahia tenha sido torpedeado). Como é sabido, poucos dias depois do doloroso acontecimento apareceu um submarino alemão na Argentina, e pode haver ainda um segundo ou terceiro”, afirmou Dutra. Mais grave: outros navios teriam ainda entrado em conflito com tropas alemães poucos dias antes. “Dois dos nossos navios, em missão idêntica à do Bahia, através de seus aparelhos, localizaram um submarino e chegaram a atacá-lo com bombas de profundidade”, relata o almirante.