FALECEU DUCÃO, o artesão das ferragens

 

Ducão era um velho conhecido dos velejadores gaúchos pelo seu trabalho na manufatura de ferragens para barcos. Era um artesão que fazia peças conforme as necessidades da clientela. Do convívio de muitos anos nasceram várias amizades que agora se tranformaram em boas lembranças.

Para homenageá-lo, republicamos uma reportagem de Ricardo Pedebos para o site do VDS feita com Ducão na sua oficina em julho de 2009.

 

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De suas mãos hábeis ainda são moldadas peças de metais na pequena oficina à beira do Guaíba, na vila ao lado do Veleiros do Sul. Tem sido assim a mais de 50 anos a vida de Ricardo Juares Ferreira, 64 anos, conhecido no meio náutico como Ducão. Artesão de primeira linha recebeu do seu padrasto Romeu Gloor, a tradição de fazer ferragens para barcos do tempo que os cascos eram de madeira e as velas de algodão.

Ducão lembra que na década de 1950 aqui não havia fabricas de material náutico em série, diferentemente de hoje onde o mercado é dominado por empresas nacionais e estrangeiras. Porém ainda há pessoas que preferem seu trabalho. “Tem gente que ainda me procura, às vezes por que precisam algo especial em ferragem. Eu mesmo corto a chapa, dobro, dou acabamento e monto as peças, uma fica igual à outra”, diz orgulhoso.

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Aos 16 anos, o já então metalúrgico Ducão foi trabalhar no conhecido estaleiro de Casemiro Durajski que funcionou na Av. Copacabana na década de 1960, onde o padrasto já trabalhava. “Lá fabricavam vários tipos de barcos de madeira, Snipe, Pingüim, Guanabara e as ferragens eram com a gente”. Recorda também que conforme iam sendo construídas novas classes, eles precisavam aprimorar as peças para atender as necessidades do desenho dos barcos. Nos anos 60 ele e o padrasto começaram a fabricar mordedores que tinham um sistema de engrenagem muito eficiente para prender os cabos. “A gente levava os mordedores para serem vendidos nas competições em SP e no RJ. Tinham boa aceitação”, conta.

Desse tempo, Ducão ainda guarda na oficina como uma espécie de relíquia o primeiro moitão feito por Romeu, no começo da década de 50, e até conta uma história sobre isso. “Certa vez uma pessoa viu o moitão e quis comprar para seu barco, mas eu disse que não estava à venda. Porém ele insistiu e argumentou que na vida tudo tinha um preço. Então ouviu de mim que não trocava nem pelo seu carro, um Opala novo na época. Naturalmente se retirou ofendido comigo.”

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No entanto depois a pessoa ficou sabendo por intermédio do sócio do VDS Adroaldo Rosa que o moitão tinha grande valor sentimental para o Ducão e até retornou à oficina para se desculpar. Ele lembra também da gozação da gurizada da vela que para implicar diziam: “Ferragem do Romeu f.....”.

Ducão veio morar aos 8 anos de idade na encosta morro da Vila Assunção, que neste tempo era coberto por vegetação, praticamente sem casas, e a avenida Guaíba não passava de um pequeno caminho de terra. Deste período também lembra do surgimento da sede do Veleiros do Sul, que em dezembro deste ano marcará o cinqüentenário da sua transferência do Navegantes para a enseada ao pé do morro da Assunção. Ele conta que tudo era diferente de hoje na região. “Aqui havia poucas casas e até tropas de gado eram levadas pelas ruas para o porto das barcas que faziam a travessia entre Porto Alegre e Guaíba, onde eram conduzidas até os matadouros.”

*Ducão foi sepultado no domingo, dia 7 de junho de 2015.