Memória Minuano: A “quarentona” Regata Seival

No ano em que celebraríamos a 50ª edição do Troféu Seival, evento que precisou ser cancelado em 2020 devido à pandemia, aproveitamos para relembrar a história da tradicional competição de vela oceânica do Rio Grande do Sul.

A série Memória Minuano de hoje volta para 2010 e relembra o 40º aniversário da regata, homenageado na edição nº 120 da revista do VDS. 

Confira a publicação e relembre os fatos mais marcantes da história do evento:

“A Seival tornou-se a competição mais emblemática da vela gaúcha. Em seus 40 anos ininterruptos de disputa acumula muitas histórias de esforço e dedicação. Novas tecnologias melhoraram os barcos e facilitaram a navegação, mas o espírito da regata continua o mesmo nas mentes dos velejadores

O Troféu Seival nasceu com a proposta de ser um evento da vela ligado a nossa cultura. O nome veio do local onde se deu uma importante batalha da Guerra dos Farrapos e do mítico barco dos heróis gaúchos comandados pelo italiano Giusepe Garibaldi que atacou Laguna. Por isso a escolha da sua data foi determinada para setembro. Se a regata traz uma carga de tradição cultural, no campo da competição também deixou sua marca.

Até o seu surgimento em 1970, pode-se dizer que as competições de vela de oceano eram feitas mais com barcos de cruzeiro e sem uma medição mais apurada. Com a instalação da regata de longo percurso veio à formação de uma classe de Oceano, propriamente definida, com característica competitiva.

As inovações necessárias para a sua realização vieram acompanhadas por grande entusiasmo dos velejadores. Um dos mentores da Seival continua em atividade na vela. É o comandante do barco Horizonte, Fernando Marsillac, 76 anos, diretor de vela de oceano do VDS em 1970, na comodoria de Frederico Cativelli e Bruno Richter, vice-comodoro esportivo.

"O Troféu Seival foi um marco para a vela de oceano do Estado, porque a partir dele elaboramos um rating para a flotilha gaúcha, baseada na fórmula de medição empregada na região dos Grandes Lagos, nos Estados Unidos. A regra foi adaptada para nossa realidade e o responsável por este trabalho foi o Lászlo Böhm. Se não estou enganado, nós a denominamos RGS, mas não tem nada a ver com a atual," conta Marsillac.

Para o cálculo foram computadas as medidas de comprimento total do casco, linha d'água e área vélica. E essa regra perdurou por muitos anos sendo superada mais tarde pela entrada da IOR. Outra mudança que veio com o Seival foi o fim da proibição do uso da vela balão nas regatas, que até então não era permitido porque nem todos veleiros possuíam este tipo de vela.

“O Seival nasceu de nossa proposta de uma competição da classe oceano que se mantivesse permanente na agenda da vela e não temporariamente, como quase sempre acontecia até então. Quando ocupei o cargo era esta a minha intenção", lembra Marsillac.

Outra característica marcante do Seival foi o seu cunho de enaltecer a tradição gaúcha. "Isso nos motivou a fazer a largada da regata de maneira cívica festiva no cais central de Porto Alegre para que a população acompanhasse de perto o evento”, diz Marsillac que participou da primeira edição com o veleiro Mistral.

Walther Bromberg e Astélio dos Santos também competiram na primeira Seival e contam das dificuldades da época, se comparadas com as atuais. “Não lembro mais como foi a primeira regata, apenas que eu e o Lászlo participamos em nosso barco de madeira, o Sapeca. Mas a imagem que me marcou do Seival é a da rega- que a tripulação em geral enfrenta o vento forte, frio e ondas," relata Bromberg. Na época da navegação estimada ele também recorda de outras dificuldades. "Encontrar os faroletes de marca de percurso da regata na Lagoa era complicado. Quase sempre estavam apagados."

Já Astélio fala sobre as mudanças da maneira de competir na regata. “Não havia o sistema de posicionamento global, a navegação era feita da maneira tradicional. As funções dentro barco eram bem divididas: o navegador só se dedicava ao cálculo dos rumos, a tripulação se revezava por turnos e tinha até cozinheiro. Os barcos eram ruins, mas tudo era bem divertido”.

Nos 40 anos de disputa da Seival há muitas histórias e "causos" que certamente dariam um livro. Cada regata tem uma peculiaridade, uma singularidade que foge da normalidade. Em termos de resultados dois casos se destacam. Em 1978 nenhum barco cruzou a linha de chegada. E em 1982 o veleiro Five Star, comandado por Fernando D'Avila, de Pelotas foi o único a chegar devido a uma tempestade que dizimou a flotilha de 21 barcos. Nelson Ilha era um dos cinco tripulantes do Five Star e lembra da tática usada para driblar o temporal.

"Ficamos abrigados na ilha do Junco à noite inteira para fugir dos ventos de mais de 100 km/h. Nós ficamos molhados e com frio. Quando as condições melhoraram pela manhã seguimos correndo a regata e vencemos".

Um comandante marcou seu nome no Troféu Seival. Foi Alfredo Bercht, que ganhou 10 vezes a regata. Com o barco Inca 2000, feito de madeira Timbaúva, chegou em primeiro lugar por cinco vezes seguidas, de 1985 a 1989. Esta marca ainda está à espera de ser ultrapassada.” 

*Texto extraído da Revista O Minuano nº 120 / novembro / 2010